terça-feira, dezembro 29, 2009

MELHORES FILMES VISTOS E REVISTOS EM 2009

Um ato de reverência à morte: A Partida



Todos os filmes aqui citados foram vistos em DVD. É indispensável fazer a menção, porque pode causar estranheza a ausência de alguns filmes estreados este ano. (Acho que já disse que não tenho mais saco pra assistir filme em shoppings. Talvez seja o caso daquele tipo criado por Chico Anysio, que, desolado, dizia: "É, é a idade"...) Só "Os Falsários" foi visto em sala de cinema, no Espaço (ou Centro?) Cultural Dragão do Mar, de Fortaleza, mas não gostei o suficiente para incluí-lo entre os melhores do ano. Isso dito, passemos às duas listas, que estão em ordem preferencial.

FILMES INÉDITOS

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A Partida (Yojiro Takita/2008)
- Verão Violento (Valerio Zurlini/1959)
- O Passo Suspenso da Cegonha (Theo Angelopoulos/1991)
- O Céu de Suely (Karim Ainouz/2006)
- A Marquesa d'O (Eric Rohmer/1976)
- Gaviões e Passarinhos (Pier Paolo Pasolini/1965)
- Dúvida (John Patrick Shanley/2008)
- A Troca (Clint Eastwood/2008)
- Sangue de Pantera (Jacques Torneur/1942)
- O Diabo Disse Não (Ernst Lubitsch/1943)


FILMES REVISTOS

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Violência e Paixão (Luchino Visconti/1974)
- De Punhos Cerrados (Marco Bellocchio/1965)
- Vidas Secas (Nelson Pereira dos Santos/1963)
- A Embriaguez do Sucesso (Alexander Mackendrick/1957)
- Pickpocket (Robert Bresson/1959)
- Não Amarás (Krzysztof Kieslowski/1988)
- Pacto Sinistro (Alfred Hitchcock/1951)
- O Condenado (Carol Reed/1947)
- Ginger e Fred (Federico Fellini/1983)
- Bola de Fogo (Howard Hawks/1941)

terça-feira, dezembro 22, 2009

NATAL, PAPAI NOEL E ESPÍRITO NATALINO


Foto in : www. fotopg. com.br/



Ainda não terminara o mês de novembro e o meu neto de sete anos já havia escrito a carta ao Papai Noel, incluindo o pedido para o irmão mais novo, que ainda vai levar alguns anos para aprender a escrever. E eu fiquei pensando no dia em que lhe ocorrer a descoberta do mito do velho de vermelho e barba branca, que emite aquele ridículo som de ô, ô, ô, ô, que deve ser o primeiro golpe na inocência da criança. Outros lhe serão desferidos com o passar dos anos, à medida que a infância é deixada para trás, e ele, especialmente se for dotado de muita sensibilidade e consciência crítica, irá se confrontar com um mundo tão diferente daquele de quando era menino.
Imagino o meu neto daqui a alguns anos se deparando com a realidade do Natal. Um acontecimento que deveria ser um exemplo de amor entre as pessoas, mas amor de verdade, não esse amor de fachada, esse amor falso. O Natal transformado em um apelo intenso ao consumismo desenfreado, dirigido pela televisão para engordar ainda mais a conta bancária dos comerciantes e industriais.
E atrelado a essa febre de vendas dos shoppings, onde Papai Noel fica de plantão, vem esse tal de espírito natalino. Não vou ser injusto, não vou generalizar. Há pessoas que vivem de fato esse espírito de amor ao seu semelhante, de caridade (não apenas a prática da caridade de dar um dinheiro e ficar com a consciência tranquila), sim, existe gente assim. Existem até os que são tocados por esse espírito natalino durante todo o ano. Isso deveria ser a celebração do Natal, a sua essência de um evento religioso. Mas existem, e são a maioria, os hipócritas, os que estendem a mão ao outro, o abraçam, lhe desejam um Feliz Natal apenas cumprindo uma convenção social. (E entre esses, não poderiam faltar os políticos, que ocupam a tevê para levar a sua mensagem aos cidadãos.)
Trabalhei em banco por quase trinta anos e experimentei isso, convivi com isso. Os funcionários do mais alto grau de hierarquia, com umas poucas exceções, sabiam explorar bem o seu cargo no que se refere ao tratamento que dispensavam aos subalternos, ao relacionamento com eles, em especial àqueles no último grau de inferioridade profissional. Autoritários, grosseiros, o rei nas barrigas, como por um milagre, se "humanizavam" às vésperas do Natal. E aí saíam de seus postos para dar-lhes a mão e o abraço de tartufo. E para completar toda a "encenação", ainda promoviam um encontro de confraternização.
Pois é, Renan. Tudo isso você vai sentir quando for um homem maduro, e, então, vai ter saudade do tempo em que acreditava que o Papai Noel era um velho pródigo e generoso que lhe dava um presente a cada Natal.

terça-feira, dezembro 15, 2009

O BAÚ

Foto in Google




De uns meses já, vinha observando que a situação estava mudando. Apreensivo, sentia o Supremo Mandatário perder, gradativamente, a sua autoridade, embora a sua Guarda Policial se mantivesse ativa na repressão. E nas prisões aumentasse cada vez mais o número de contestadores. No entanto, as manifestações de protesto se sucediam: nas passeatas, nos jornais, nas realizações artísticas. Sentia que, mesmo entre os membros do Colegiado, havia vozes divergentes. Outro grave sintoma da crise por que estava passando o Regime: o líder do único Partido, responsável pela assunção ao poder do Supremo Mandatário, tinha repentinamente silenciado. Sua ausência nas últimas solenidades oficiais era motivo de especulações. O Grande Chefe (como era tratado pelos seus liderados) teria caído em desgraça e estaria fazendo companhia, na prisão, aos inimigos do Regime. Ou estaria refugiado no exterior, ao abrigo da justiça dos futuros detentores do poder.

Um belo dia o Regime caiu. Previu a queda, três dias antes. Despiu-se do uniforme do Partido, retirou da parede do quarto os retratos do Grande Chefe e do Supremo Mandatário, e, de sob a fronha, a bandeira do Partido, com que se cobria ao dormir. Atirou tudo num baú velho. Na madrugada, carregou o baú para o quintal da casa. Próximo a um limoeiro, cavou uma vala profunda, onde o enterrou. Num papel, demarcou o local. Dia seguinte fugiu para um outro país.

Durante o tempo que lá permaneceu, acompanhou atentamente a nova situação do seu país. Com ódio, mas com esperança. Esperou muito tempo, mas não em vão. Um dia, a situação voltou ao que era antes de sua fuga. O Grande Chefe fora de novo o responsável pela volta ao poder, não mais da pessoa do antigo Supremo Mandatário, que esse fora passado pelo fuzis, mas de um seu filho. Quando regressou, sua primeira providência foi ir ao quintal, munido do papel que conservara em seu poder. Desenterrou o baú e abriu-o ali mesmo: tudo intacto. No mesmo dia mandou lavar e passar o uniforme e a bandeira. Limpou carinhosamente os retratos. Uniformizado e conduzindo em cada mão um retrato, saiu às ruas para comemorar a vitória. Ao voltar para casa, pendurou os retratos na parede e despiu o uniforme, que guardou. Depois foi dormir, enrolado com a bandeira, como não fazia há muitos anos.


NATAL (1977)


- Extraído do meu livro de contos Não Enterrarei os Meus Mortos (1980).

terça-feira, dezembro 08, 2009

MÚSICAS E LEMBRANÇAS



Já contei aqui o fato. No lançamento do livro de um autor local havia a presença de um violonista. Na fila de autógrafos uma senhora acompanhada do marido, ambos nos seus presumíveis sessenta e poucos anos. Quando o músico começou a tocar "Velho Realejo", valsa de Custódio Mesquita e Sady Cabral, gravada por Sílvio Caldas, ela, incontinenti, deixou a fila, foi até ele e lhe pediu que não tocasse a música. O homem a atendeu e ela voltou para o seu lugar. É evidente que aquela música não lhe trazia uma boa recordação. Qualquer que fosse a recordação, só o marido deve saber.
Acontece com todos nós lembranças relacionadas com algumas músicas. Na maioria dos casos, trata-se de boas lembranças, mas há as dolorosas, como se dá com aquela senhora. Inúmeras delas que compõem os meus CDs me trazem lembranças, sempre que as ouço, da minha infância, as quais pertenciam ao acervo do serviço de alto-falante da minha cidade e do Cine Canindé. A discoteca do cinema era pequena e não se renovava, assim as mesmas músicas eram tocadas todas as noites em que havia sessão.
Mas se uma música pode proporcionar uma lembrança doce, ou amarga, pode também trazer à tona um momento engraçado, para quem a ouve. No meu caso, por exemplo, das músicas que fizeram parte da minha infância, duas me transportam a dois momentos divertidos, sempre que as ponho para tocar. Uma é "Respeita Januário", de Luiz Gonzaga. É impossível não deixar de sorrir no trecho da letra que diz "Luiz, respeita os oito baixos do teu pai", pois ele me faz lembrar da minha mãe (uma grande fã do cantor e compositor pernambucano), que, nas suas primeiras audições da música, em vez de "oito baixos", entendia "sovaco": "Luiz, respeita o sovaco do teu pai".
Já o bolero "Malagueña", faz-me ver, como se num filme, três de meus irmãos, já rapazes, cantando-o naquela língua que não conhecia, mas parecida com o português, como se formassem um trio - um trio, é bom dizer, sem o mínimo talento vocal para seguir a carreira artística. Estranhava especificamente a frase "que bonitos ojos tienes", por causa da palavra "ojos", que eu entendia como "ovos". Com meus oito, nove anos, já sabia que ela era usada como sinônimo de testículo. Então, eu ficava sem entender como podiam ser bonitos os testículos de alguém.

terça-feira, dezembro 01, 2009

15 FILMES DE GRANDE FINAL (2) *



... ó Carlito, meu e nosso amigo, teus sapatos e teu bigode
caminham numa estrada de pó e esperança.

Carlos Drummond de Andrade
("Canto ao Homem do Povo Charlie Chaplin")



- Hiroshima, Meu Amor (Alain Resnais)
- Casablanca (Michael Curtiz)
- Depois do Vendaval (John Ford)
- Um Rosto na Noite ** (Luchino Visconti)
- Tempos Modernos (Charles Chaplin)
- Zorba, o Grego (Michael Cacoyannis)
- A Estrada da Vida (Federico Fellini)
- Segredo das Jóias (John Huston)
- O Céu de Suely (Karim Arnouz)
- Doutor Fantástico (Stanley Kubrick)
- O Terceiro Homem (Carol Reed)
- Fahrenheit 451 (François Truffaut)
- A Carruagem de Ouro (Jean Renoir)
- História Real (David Lynch)
- Pai e Filha (Yasujiro Ozu)

* Ordem não preferencial.
** No lançamento em DVD, o filme tem o título de "Noites Brancas".