sábado, maio 19, 2007

O DIRETOR MARLON BRANDO

"A Face Oculta" (One-Eyed Jacks/1961) representou a única experiência de Marlon Brando na direção. Ele substituiu Stanley Kubrich, que mal esquentou a cadeira de diretor, sendo demitido pelos produtores, dizem que por imposição do ator.
Lançado agora em DVD, depois de ter saído em vídeo, "A Face Oculta" insere-se na categoria do "western psicológico" ao enveredar pela análise dos dois personagens principais: Rio, vivido pelo diretor, e Dad Longworth (Karl Malden), o primeiro traído pelo segundo, após assaltarem um banco e serem perseguidos pelos policiais. Desde a sua permanência por cinco anos na prisão, Rio se torna um obcecado pelo acerto de contas com o ex-comparsa, que, nesse período, passara para o outro lado da lei, assumindo o cargo de xerife de uma cidadezinha. A partir do reencontro dos dois, eles conseguem, por algum tempo, estabelecer uma convivência que só aos olhos dos que desconhecem o que houvera entre eles pode parecer cordial e pacífica. Na verdade, uma relação tensa, como se fora de um pai (não deve ser por acaso que o nome do xerife, em inglês, significa pai) com o filho (a quem ele chama de Kid), o primeiro sempre em guarda contra o segundo, consciente de que ele voltou para lhe cobrar a dívida. Veja-se, por exemplo, o "close" do olhar assustado de Dad, ao ver do alpendre de sua casa a silhueta de Rio cavalgando em direção a sua casa. É uma boa cena. Há uma "grade" de madeira, e o enquadramento do rosto do xerife entre as barras sugere as de uma prisão onde esteve o visitante.´
É preciso chamar a atenção para a presença, no filme, de um elemento insólito na dramaturgia do "western": o mar. Próxima ao mar fica a residência de Dad. É para uma pousada litorânea que Rio vai se recuperar das chicotadas que lhe aplica o xerife (como um pai castigando o filho), que completa o suplício, fraturando-lhe a mão. É à beira do mar que ele tem o encontro amoroso com Louisa (Pina Pellicer), enteada de Dad. E ainda lá dela se despede no final do filme. E é uma presença marcante, pois a sua função não é apenas de servir de um cenário inusitado dentro do gênero, mas como a sublinhar, no torvelinho das ondas, a agitação interior de Rio.
Marlon Brando conduz "A Face Oculta" com firmeza, sensibilidade e até, em um ou outro momento, com brilho. Um exemplo é na cena em que Louisa confessa à mãe Maria (Katy Jurado) que está grávida. A reação da mãe é mostrada pela expressão do rosto, em que se revela um misto de pena e de compaixão pela sorte da filha. E após grudar o olhar numa abatida Louisa, Maria se afasta um pouco, ajoelha-se e põe-se a rezar. E sendo Brando o ator que era, ele soube transmitir a sua arte, principalmente nesse grande momento da atriz mexicana (talvez o maior do filme). Mas todos os outros atores, até os de pequena participação estão bem.
Por fim, a julgar por esse filme, só temos a lamentar que Brando não tenha prosseguido na carreira de diretor. Não seria, provavelmente, tão grande na direção quanto o foi na interpretação, mas, no mínimo, teria se convertido em um cineasta a ser observado com atenção e interesse.
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CURIOSIDADES
1.A atriz Pina Pellicer, nascida no México, que interpreta Louisa, cometeu suicídio três anos depois de trabalhar no filme. Tinha apenas 30 anos.
2. Consta que Sam Peckinpah (o diretor de "Meu Òdio Será Sua Herança") foi quem começou a escrever o roteiro, mas o abandonou depois da demissão de Kubrick Kubrick Brando e Peckinpah. Como se teriam desenrolado as filmagens com a particpação desses três homens de temperamentos tão fortes e de convivência tão problemática?

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