Lançado agora em DVD, "A Embriaguez do Sucesso" conserva o impacto e o vigor da crítica ao tipo de jornalismo sensacionalista, 52 anos depois de chegar ao cinema. A personificação maior desse lado sujo da imprensa é J.J. Hunsecker (Burt Lancaster), definido por um colega como "um homem com escrúpulos de um porquinho da índia e princípios de um mafioso". Um homem poderoso, por causa da coluna que escreve e apresenta na televisão, que é consumida por milhões de pessoas, com ligações com a política e a polícia. E se J.J. simboliza o poder, a fama e o prestígio conquistados pelo tipo de jornalismo que pratica, Sidney Falco (Tony Curtis), igualmente inescrupuloso, representa a ambição de chegar ao topo do sucesso do outro. Publicitário de profissão, Sidney é, na prática, um assessor de J.J, o homem encarregado de fornecer matéria para a coluna.
Dois personagens "antipáticos", perversos, que manipulam, chantageiam pessoas. J.J. faz chantagem até mesmo com Sidney, deixando por muitos dias de publicar as notícias que este lhe fornece, porque Sidney ainda não conseguira uma forma de desfazer o namoro da irmã de J.J, Susie (Susan Harrison) com Steve (Marty Milner), guitarrista de um conjunto de "jazz". A obstinação (que chega à obsessão) com que o colunista persegue esse objetivo, buscando separar o casal, não configura uma preocupação com a condição social e profissional do rapaz, isso não é percebido em nenhum momento do filme. Na verdade o que se percebe é uma atração dele pela irmã, com quem mora, que é sugerida em duas cenas: uma, quando J.J. entreabre a porta do quarto dela e, como um "voyeur", a observa dormindo; e a outra, já quase no final, quando, de sua janela, ele a olha caminhando em direção ao hospital, onde está internado Steve. A expressão dele é de quem sofreu uma perda.
Steve aparece como uma espécie de "mocinho" em oposição ao "vilão" J.J. e seus acumpliciados. Confronta-se com Sidney em mais de uma ocasião - na boate, a quem acusa de o estar espionando, e no escritório do publicitário os dois quase chegam a se atracar, depois de uma calorosa discussão. E no seu único encontro com J.J. no auditório da televisão, tem a coragem de desafiá-lo, ao questionar o seu poder, o seu prestígio. Pela primeira vez afrontado na sua privilegiada condição pessoal e profissional, o ego de J.J. sofre um abalo e o leva a tomar uma decisão drástica: obriga Sidney, em troca de este substituí-lo na redação da coluna no período em que pretende viajar com a irmã, a combinar com um conhecido truculento policial a eliminação de Steve.
O fato de não se saber se Steve escapará da morte (ao contrário de Sidney, que é morto pelo policial e o seu parceiro, a mando de J.J., como resultado de uma situação que reforça a percepção da atração do irmão pela irmã) é mais um trunfo do filme, ao não mostrar o encontro dos namorados no hospital, fazendo-o escapar do risco de um final feliz que poderia causar danos à proposta do filme.
A direção de Alexander Mackendrick, o mesmo de "Quinteto da Morte" (1955), é admirável, inclusive por poder revelar que Tony Curtis possuía potencial como ator e não era apenas um rosto bonito. Sua atuação é tão boa quanto a de Burt Lancaster e talvez a supere em um ou outro momento. E depois desse filme, Curtis reafirmou a posse de recursos interpretativos, até para a comédia, na qual brilhou em filmes como, por exemplo, "Quanto Mais Quente Melhor", de Wilder.
* * * * * * * * * * * *
NOTA - Realizado em preto e branco, "A Embriaguez do Sucesso" foi colorizado na transposição para DVD. Isso causou um grande prejuízo à fotografia de James Wong Howe, "o mestre do claro-escuro", conforme o chamou Antônio Moniz Vianna em sua crítica quando o filme foi lançado. Trata-se de um crime contra a integralidade de uma obra, cujos autores deveriam ser punidos.
7 comentários:
ah, eu vi com outro nome no telecine. vou tentar lembrar. eu adorei esse filme. muito bom. vim pela foto do pôster no blog do moacy. beijos, pedrita
Querido amigo
Penso que já lhe disse que em finais dos anos 50 e década de 60 passei muito pouco tempo em Portugal.
Por isso só mais tarde pude ver este filme, mas cá em Portugal correu com outro nome (não me lembro bem...o cheiro do sucesso, ou o perfume do sucesso..., não me lembro); consegui alugá-lo no videoclube, porque me disseram que era muito bom.
De facto gostei muito. Eu gostava muito, dum modo geral, dos filmes com Burt Lancaster. Nessa altura era ele ainda um joven talento...
Muito obrigada pela visita ao Histórias (conseguiu safar-se do chumbo...). No Brasil usam este termo "chumbo" para designar reprovação?
Amanhã vou contar outra história. Já lhe disse que resolvi contar histórias à QUARTA-FEIRA?
Se quiser pode ir "ouvir".
Uma noite feliz.
Beijinhos carinhoso
Mariazita
Esse eu não vi. Mas assisti ao filme anterior da dupla Tony Curtis/Burt Lancaster, uma produção de 1956, chamada "Trapézio". Aliás, um filme muito bom. Sua análise sobre este filme é instigante, nos deixa com bastante curiosidade para vê-lo ou locá-lo. Muito bom. Carpe Diem. Aproveite o dia e a vida.
Querido Francisco
A menina malvada vem em paz!
Veja o que lhe trago...
Minha mensagem de Páscoa
Que o domingo de Páscoa seja muito bom, e, se possível, ao lado das pessoas a quem você quer bem.
A Páscoa comemora a ressurreição de Cristo, o seu renascimento.
Por isso nada melhor do que aproveitar este domingo para reflectir, fazer o levantamento da vida para saber se é necessário recomeçar.
Porque, Páscoa é isso, é o momento de renascer - seja para o novo modo de vida, para o amor, para amizade…
Que para nós seja o renovar de amizade, são os meus votos.
Beijinhos
Mariazita
Amigão Sobreira
Obrigado por ter vindo.
Volte sempre.
Amanhã haverá post novo.
Boa Páscoa para si e todos os seus.
Abraço fraterno
Botinhas
Querido Francisco
A "setôra" (conhece o termo, com certeza....) vem agradecer a sua visitinha ao "Histórias de Encantar", e renovar os votos de Páscoa muito feliz.
Beijinho carinhoso
Mariazita
Querido Francisco
Paroles, paroles, paroles... conhece essa música, com certeza.
Pois é ...porquês...perguntas...
dúvidas...
Com o tempo tudo se sabe, tudo se descobre.
Agora a menina malvada diz ao "bad boy" - tradução "menino feio", para o caso de não saber...pois diz que, se prestasse atenção, se não estivesse distraído nas aulas, saberia que o padre original morreu há um certo tempo, e o actual é um jovem e belo "ragazo".
Atenção, não vá se habituando a estas explicações extra - senão vai ter pagar, extra também!!!
Feliz Páscoa
Beijinhos
Mariazita
Postar um comentário