quarta-feira, abril 26, 2006

SOBRE UM BENFEITOR DA HUMANIDADE


Este artigo foi publicado num jornal de Natal em 5/7/1987. É aqui republicado com mínimas alterações de datas, nomes de filmes e de linguagem.
Numa longa entrevista ao jornalista Giovanni Grazzini (transformada no livro Fellini - Entrevista sobre o Cinema), Fellini, em mais de uma ocasião, refere-se ao ator cômico como um benfeitor da humanidade. Para ele, esses artistas que possuem o talento de fazer as pessoas se aliviarem de suas cargas de sofrimentos e tensões com a liberação do riso reparador, são tão importantes para o destino da humanidade, quanto um cientista que se dedica ao trabalho de descobrir a cura de uma enfermidade letal. Pode-se até presumir que a admiração do cineasta italiano por esses atores encubra uma certa inveja pelo bem que eles fazem ao espectador, quando ele revela o desejo de ter nascido para fazer rir.
O ano de 1987 assinala o trigésimo aniversário da morte de um desses benfeitores da humanidade - um dos maiores. Foi em 1957 que faleceu Oliver Hardy, que se tornou conhecido e amado em todo o mundo como "O Gordo". Estava afastado da tela há seis anos, desde A Ilha da Bagunça, que marcou a aposentadoria da maior dupla que teve o cinema, em cujo rastro inúmeras outras surgiram, até mesmo no cinema brasileiro. No ano anterior, O Gordo teve uma aparição episódica no filme de Capra, Nada Além de um Desejo, com Bing Crosby. Mas o seu nome não apareceu nos créditos.
Os dados biográficos do Gordo dão-no como tendo abandonado o curso de Direito, para abrir um cinema. E impressionado com o trabalho dos atores, resolveu tentar a interpretação. É em 1914, como "Babe" Hardy, que o seu nome aparece pela primeira vez numa tela, no filme A Tango Tragedy. Os fãs de cinema teriam que aguardar treze anos anos para vê-lo ao lado de Stan Laurel, "O Magro" , em 45 Minutes from Hollywood, iniciando uma carreira que durou 23/ 24 anos. (Em 1921 eles atuaram em A Lucky Day. mas sem formarem uma dupla.) Ambos integravam a famosa equipe de Hal Roach, que os teve sob contrato até 1940. Nesse ano fundaram a sua própria companhia, "Laurel and Hardy Feature Produtions". Curioso: não produziram um só filme, preferindo excursionar pelos EUA com um show intitulado The Laurel and Hardy Revue, que era, invariavelmente, encerrado com um esquete da dupla.
Mais do que parceiros, Hardy e Laurel foram grandes amigos. Há quem assegure que a morte do Gordo foi causada, sobretudo, pelo desgosto de ver o amigo preso a uma cadeira de rodas, em consequência de um enfarte. Quando ele morreu, Paulo Mendes Campos (se não estou enganado) escreveu uma crônica em que dizia que não queria estar no lugar da pessoa que foi levar ao Magro a notícia da morte de Hardy. Até morrer em 1965, Laurel sempre cuidou para que nunca faltassem flores no túmulo do amigo.

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