quarta-feira, março 08, 2006

"Com certeza"


Amigo, Amiga, que visitam este blogue, me respondam uma coisa: quantas vezes, durante o dia, em contato com pessoas, ou vendo televisão, vocês ouvem a expressão "com certeza"? Quinze, vinte, trinta vezes? Ou mais? Já perdi a conta. Você liga a tevê, um jogador de futebol é entrevistado e, tão certo como Lula estava ciente da imoralidade do seu partido e dos partidos aliados no caso do mensalão, a uma pergunta do jornalista, lá vem a resposta: "com certeza". Mas não ocorre apenas com jogador, uma categoria na qual são muito poucos os que conseguem ter um discurso articulado e que fuja da mesmice das palavras e das idéias. Também políticos, ministros, o presidente, juristas, médicos, o diabo a quatro. Até de escritores já ouvi essa expressão, que já vem sendo usada há muitos anos. O abuso já chegou a um ponto que até um boteco, aqui perto de casa, foi batizado de "Com Certeza". Parece que foi a Leda Nagle, aquela que interrompe a todo instante o entrevistado do "Sem Censura", que divulgou essas duas palavrinhas que, parece, vieram para ficar. Não tenho esperança de deixar de ouvi-la antes de morrer. Um dia desses um encanador veio fazer um serviço num banheiro do meu apartamento. Em uns dez minutos, no máximo, que conversamos, eu querendo saber a causa do problema, o encanador, aliás, muito competente, a cada pergunta que eu lhe fazia, ele iniciava a resposta com um "com certeza". Com certeza, Seu Francisco.
Houve um tempo em que se abusava de "inclusive". Ainda se usa, mas com certa parcimônia. Me lembro que meu pai só faltava ter um ataque de nervos ao ouvir essa palavra em excesso. A implicância dele era, principalmente, quando "inclusive" iniciava uma frase. Uma vez estávamos vendo tevê e um jornalista entrou pra falar sobre futebol. Papai detestava futebol, tanto quanto detestava cinema (não puxei a ele), mas ficou ouvindo atentamente a fala do jornalista, que durou cerca de dez minutos. Ao final, papai não conteve a satisfação (quase , poderia dizer, a felicidade): "Cabra bom. Não usou uma só vez 'inclusive'". E, imitando-o, quando vejo alguém ser entrevistado na tevê e, em nenhum momento, o ouço pronunciar "com certeza", me lembro do velho e digo pra mim mesmo "cabra bom".

Nenhum comentário: