domingo, janeiro 01, 2006

A CHINESINHA

Tomei o primeiro, longo gole de cerveja, degustando o prazer da bebida bem gelada. Em seguida, virei o rosto para a parede à minha direita, onde estava dependurado um quadro emoldurado e envidraçado. A peça, que não parecia (de acordo com os meus modestos conhecimentos de artes plásticas), executada por um verdadeiro artista, representava sete pessoas (4 homens e 3 mulheres), cada uma delas exercendo uma função. Um dos homens portava um instrumento musical, outro montava um cavalo, uma mulher aparecia segurando uma flor, e assim por diante. Um atrás do outro, formando uma fila indiana. Era um quadro chinês, pois o restaurante era chinês. Havia outro quadro na parede à minha esquerda, embaixo do qual se postava a longa mesa onde era exposta a comida para os clientes se servirem. Mas nem sei dizer o que o quadro representava, pois me desinteressei de olhá-lo.
A chinesinha que me atendeu teria, se muito, dezoito anos, era magrinha, como parecem ser todas as chinesas, pelo menos, as jovens. O seio quase inexistente me fez lembrar a expressão "peitinhos de pitomba", de uma música do Chico. Mas bonitinha, com um rabinho-de-cavalo, e se chamava Jini. Havia outra moça, um pouco mais velha, e um homem, esse, sim, gordo, não muito mais alto do que as moças. Devia ser o proprietário. Fiquei por ali só bebendo, pois ia almoçar em casa.
Descobrira o restaurante num desses sábados em que com a minha mulher fui a um shopping fazer compras. Depois das compras, seguimos para a praça da alimentação, para tomarmos umas duas cervejas. Entramos ali sem nem saber que o restaurante era chinês. Só o descobrimos quando a chinesinha nos veio atender e também verificamos a decoração. E não sei por quê (talvez o inusitado do local, com uma chinesa de garçonete), achei agradável o ambiente, e sempre que ia ao shopping, aparecia lá para tomar a minha cerveja.
Os ocidentais acham que as pessoas da raça oriental são todas parecidas no físico. Talvez eles digam o mesmo de nós. Bom, o certo é que teve um dia que eu achei que Jini, a chinesinha, era como estar vendo a bela atriz Gong Li. Só que bem mais nova. E um dia falei a ela da semelhança entre as duas. Jini me olhou admirada e não disse nada. Suspeitei que ela não soubesse quem diabo era Gong Li.
Uma vez fui atendido pela sua companheira. Era também bonitinha, me disse o seu nome, mas não o guardei. Soube que Jini estava adoentada. Doença grave, perguntei. A moça não disse nem sim, nem não. Era atenciosa e mais comunicativa do que Jini. Como a cerveja não estivesse muito gelada, trouxe, sem eu pedir, um balde com cubos de gelo, onde pousou a garrafa. Fiquei por ali, vendo pela milésima vez o quadro, enquanto os primeiros clientes chegavam para almoçar. Dessa vez me deu vontade de comer um pastel.
Voltei alguns dias depois e, de novo, não encontrei Jini. Perguntei à colega se ela tinha melhorado. E, coisa estranha, de novo ela ficou muda. Nem um sim, nem um não. Coisa mais estranha!
Não resisti a perguntar por Jini, na vez seguinte. E o mesmo silêncio da garçonete, mas com uma diferença: além do silêncio, ela esboçou um sorriso, cujo significado não consegui decifrar. A partir daquele dia, desisti de indagar pela chinesinha. Houve uma ocasião, depois de beber três cervejas (habitualmente não passo de duas) , em que senti o impulso de perguntar ao proprietário o que fora feito de Jini. Mas nem cheguei a me levantar. Deixa pra lá, disse pra mim . E, embora continue frequentando o local, apreciando a cerveja bem gelada (quando não está a meu gosto, a garçonete providencia o balde com gelo), confesso que sinto falta da sósia de Gong Li. Onde ela estará? O que terá sido feito dela?

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