terça-feira, setembro 06, 2005

UM CHORINHO PARA VOCÊ


Há mais de um ano publiquei o texto abaixo no Balaio Vermelho, do amigo Moacy Cirne (na época eu nem imaginava em criar um blog). Ele é aqui republicado por não ter, no momento, nenhum assunto novo. Ei-lo.
Na Canindé dos anos cinquenta havia um cinema que funcionava às quintas, sábados e domingos, numa única sessão. A programação era feita, se é que posso confiar na memória, da seguinte maneira: às quintas passava um seriado, complementado, ou por um filme B americano, ou por um western daqueles do Durango Kid e similares; aos sábados e domingos era, geralmente, exibido o mesmo filme, quase sempre do gênero aventura (um exibido com uma certa frequência era Jim das Selvas, com o ex-Tarzan Johnyny Weissmuller), mas, às vezes, aparecia um melodrama, ou uma comédia romântica, que os meninos detestávamos, rotulando-os de "filmes de amor".
Comecei falando da programação do Cine Canindé, mas, na verdade, quero falar é de uma música que, entre outras (poucas, pois a discoteca do cinema era pequena), tocava-se enquanto aguardávamos o início da sessão. Ela conservou-se em minha memória durante décadas, juntamente com outra, intitulada Como os Rios que Correm para o Mar, um samba-canção de Custódio Mesquita e Evaldo Ruy, na voz de Sílvio Caldas. Mas, enquanto com esta música não levei muitos anos para descobrir-lhe o título e os autores, com a primeira (uma composição instrumental) isso só veio a ocorrer há bem pouco tempo.
Pois eu cresci, arranjei trabalho, casei, os filhos vieram, depois os netos, me aposentei, e aquela música não me saía da lembrança, e cadê a oportunidade de voltar a ouvi-la, se não sabia o seu título? Uma vez, faz uns dez anos, cheguei a pensar que a tivesse reencontrado. Ao sintonizar um canal de tevê, estava sendo tocada uma música que me pareceu ser ela, mas nem houve tempo para que tivesse a confirmação, a execução encerrou-se logo depois.
Foi, então, que, no ano passado, assisti a uma apresentação de Paulo Moura num desses canais a cabo. Tive sorte em ligar o televisor um pouquinho antes da apresentação, porque ele a iniciou com nada mais, nada menos do que a música que ansiei voltar a ouvir por tantos e tantos anos. Quase não acreditava no que via, ou melhor, ouvia. E, afinal, fui saber o título e o compositor: Um Chorinho para Você, do pernambucano Severino Araújo, o criador da longeva Orquestra Tabajara, ainda vivo e caminhando para os noventa anos. É possível que a minha satisfação fosse completa se tivesse me reencontrado com esse chorinho na gravação original, que fico pensando se não é da própria Tabajara. Mas é como se diz: não se pode ter tudo na vida. O que importa é que pude gravar a música, na grande interpretação de Paulo Moura, quando o programa foi reprisado uns dois dias depois, e ela está à minha disposição, sempre que sentir saudades daqueles tempos da minha infância. Quando não havia Padre Marcelo, nem Preta Gil, nem Xitãozinho e Xororó, entre tantos outros "cantores".

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