terça-feira, junho 07, 2005

FILMES ATÍPICOS DE ALGUNS DIRETORES



Na história do cinema ocorrem exemplos de filmes atípicos na carreira de alguns diretores. Ou seja, um tipo de filme feito por alguns deles, que fugia à linha que ele traçou para a sua carreira. E o primeiro nome que me vem à cabeça é o de Marcel Carné. Esse francês realizou uma obra densa, com elementos de tragédia, de amores impossíveis, onde não faltava a preocupação com o social, ou o político, e que foi autor de pelo menos uma obra-prima, O Boulevard do Crime (1945). Pois bem. Em 1956, Carné dá uma "trégua em sua temática e faz uma comédia leve, Ele, Ela e o Outro, filme que já mencionei aqui entre alguns que vira na minha adolescência e gostaria de rever.
Em seguida vem o caso de Hitchcock, com O Terceiro Tiro, (1955). Uma comédia no melhor estilo negro, em que ele tira umas pequenas férias do suspense. É claro que o humor não é um elemento estranho na obra de Hitchcock. Mesmo nos seus filmes de maior tensão, ele sempre encontra uma brecha para fazer circular um momento engraçado e na forma de alinhamento à tradição britânica do gênero. Mas em O Terceiro Tiro o humor é a constante, ainda que orientado pela presença de um cadáver. Talvez alguém possa citar, como outro exemplo de um filme atípico de Hitchcock, O Homem Errado (1957). Só se for pelo fato de ele contar uma história verídica. Porque, além do suspense, mais diluído, é verdade, O Homem Errado apresenta o tema do falso culpado, que é recorrente na filmografia de Hitchcock (Os Trinta e Nove Degraus, Intriga Internacional, Frenesi, entre outros). Hi, já ia me esquecendo. Quatorze anos antes de O Terceiro Tiro, em 1941, Hitchcock fez a comédia Um Casal do Barulho, que, pelas informações que tenho, é um filme ainda mais atípico do que o outro na carreira dele.
Joseph Losey, americano que se exilou na Europa escorraçado pelo macartismo, hoje um pouco esquecido, quando nos anos de 1960 era reconhecido como um cineasta importante, saiu uma vez do seu universo temático. Foi em 1966, quando transportou para a tela a personagem de história de quadrinhos Modesty Blaise. Mas não se deu bem nessa mistura de aventura e comédia, que pedia um diretor de estilo leve e com talento para o humor. Entre as críticas que sofreu, houve a de Antonioni, para quem Losey não soube tirar proveito da faceta humorística de Monica Vitti.
Outro diretor inadequado para um filme que fez foi Visconti em O Estrangeiro, 1967, adaptação do romance clássico de Albert Camus. Essa avaliação peço emprestada a Moacy Cirne. Em seu livro Cinema, Cinema - Os Filmes dos Meus Sonhos (Sebo Vermelho, 2003), ele sustenta que o livro de Camus pedia um diretor que tivesse o temperamento artístico e psicológico de Antonioni e nunca o de Visconti. O propósito do nosso amigo, claro, não é de opor o gênio de um ao outro, mas de opor personalidades artísticas. Sem me lembrar quase nada do filme, que se não me empolgou, também não me desagradou, confio no taco de Moacy. Até porque O Estrangeiro nunca é citado entre os maiores filmes daquele que talvez seja o maior esteta do cinema.
Agora, se Losey não se saiu bem ao tentar fazer um filme estranho à sua obra, o mesmo não se pode dizer de Ingmar Bergman. Sim, senhor, Bergman, o grande artista que levou ao cinema temas como a velhice, a morte, os percalços por que passam os relacionamentos amorosos, etc., etc.. Esse homem amargo, pessimista, angustiado, sisudo, que, como Buñuel e Fellini, nunca se desvencilhou do fantasma da formação religiosa, foi capaz de fazer as pessoas rirem com Sorrisos de Uma Noite de Amor, uma obra de refinado humor, realizada em1955. Não apenas um filme diferente na carreira de Bergman, mas também um dos seus melhores.
Por fim, cabe mencionar John Huston, que, em 1982, fez um musical chamado Annie. Não vi o filme, nem conheço opiniões sobre como ele se saiu ao tratar de um gênero para o qual não tinha aptidão.
P.S. - Este artigo já estava pronto, quando, ao comentá-lo com Moacy e Bené Chaves , num encontro que tivemos, o primeiro me informou que Bergman realizou outra comédia: O Olho do Diabo, de 1960.

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