domingo, março 07, 2010

SÃO FRANCISCO DOS POMBOS PALACIANOS


Crônica de Manoel Onofre Jr. *



Magro, com um riso alvo a destacar-se no pretume da pele, Azulão é funcionário da Casa Civil do Governo do Estado. Função principal: prestar toda assistência aos seus "irmãos menores", os pombos, que, desde que foram expulsos das sacadas da Prefeitura, escolheram o Palácio Potengi como residência.
Em Veneza, na praça São Marcos, é o turista quem alimenta os pombos, característicos daquele lugar. Mas, aqui em Natal, à falta de turistas, o Governo do Estado resolveu cuidar das pequenas aves, dando-lhes casa e comida, ou melhor, pombal e ração de milho diária. Esta mesma teve de ser reduzida, como diz Azulão com bom humor, em face da situação dramática das finanças estaduais.
Antigamente, os pombos moravam nas sacadas do Palácio Felipe Camarão, sede do executivo municipal. Sempre foram assim, dados ao convívio de coisas e gentes oficiais. Dali saíam para passeios na praça Sete de Setembro, em frente ao Palácio Potengi, onde faziam ponto num dos canteiros. Diariamente recebiam a ração de milho das mãos de um funcionário da Prefeitura, ornitólogo frustrado. Mas, certo dia, o Prefeito resolver cortar o milho dos pombos. Estes protestaram, e a prova é que - fato ainda lembrado - "sujaram", meticulosamente, por várias vezes, os brancos ternos de linho do Prefeito e dos assessores. Certo é que o protesto nada adiantou. O alcaide manteve-se firme em sua decisão de não mais dar milho às aves. Cansadas de protestar, elas optaram pela alternativa mais sensata: se mudaram para o Palácio Potengi. Um velho pombo filosofou: "Não há males que não venham para o Bem". E em seguida comandou: "Quem for pombo, que me siga. Todos ao Palácio"!
Foi uma revoada bonita, aquela; as aves em formação aérea, deixando a Prefeitura rumo ao Palácio do Governo. Pena que ninguém tenha notado nada.
Naquele tempo governava o Estado um homem bom que se interessou pelos pombos, dando-lhes pombais nos galhos dos ficus que ficavam em frente ao Palácio. Aqui encerra-se o que se poderia denominar de "período heróico" na história daqueles pombos. Os bichinhos puderam viver, a partir de então, no que sua imagem simboliza: paz.
Paz e água fresca. Para isso muito contribui o Sr. Jorge Berto, mais conhecido por Azulão, que é encarregado de não deixar faltar milho para os "donos" da praça Sete de Setembro.

- Azulão, qu'é que você conversa com eles?
- Eles quem?
- Os pombos, naturalmente.
- Conversa de mesmo não converso não. Mas a gente se entende tão bem que conversa não faz falta. Todo dia de manhã e de tarde, eu boto milho para eles, e eles vêm e até sentam nos meus ombros, sobem na minha cabeça. Gosto dos bichinhos.

* Manoel Onofre Jr nasceu em Santana do Matos (RN), em 1943. Seguindo a carreira jurídica, aposentou-se como Desembargador. É autor de cerca de 20 livros, englobando os mais variados gêneros, inclusive a ficção. Membro da Academia Norterriograndense de Letras. Esta crônica faz parte do livro "O Caçador de Jandaíra" (Edições Sebo Vermelho/2006).


9 comentários:

Claudinha ੴ disse...

Querido amigo!
os pombos me acordavam do alto do campanário da Igreja da rua de baixo, que dava exatamente numa de minhas janelas da casa onde passava minhas férias. Confesso que não era bom na época, mas hoje... me dá uma saudade... Gostei da crônica, fala de tipos que existem em toda cidade de uma maneira muito gostosa de ler.

Sobre meu blog, por favor volte lá, agora tem uma foto de ontem que acabei de postar. Eu e meus cavalheiros antes de eu me apresentar no BCI para cantar.
Sobre a música, eu mudei o sistema, porque só aparece a canção para quem usa o Internet Explorer e este está em extinção, quem usa os navegadores Mozilla e o Google Chrome não ouve e aparece uns desenhos estranhos. Daí eu coloquei uma caixa na barra lateral, é só clicar no botãozinho do play que você ouvirá.
Beijos e obrigada pelo retorno.
Bom domingo!

DILERMArtins disse...

Mas bah, Sobreira.
Os pombos, imortalisados por Pablo Picasso, como ave da paz, são amados por muitas pessoas, mas também vistos com reservas por outras tantas para as quais o pombo é ave agourenta: Quando foge do pombal, ocorre desgraça no seio da família do dono.
Ora, o pombo é guloso. Quando há alguma preocupação na casa, enfermidade, morte ou outro evento triste, os pombos são esquecidos. Famintos, eles abandonam o pombal e vão buscar alimento noutro lugar,
nem todos os pombais têm a sorte de contar com um Azulão.

nina rizzi disse...

Sobreira, lá em Ribeirão Preto tinha um padre que promoveu uma verdadeira guerra contra os pombos que ficavam na praça da catedral da cidade. Queria extingui-los de qualquer jeito. Cê acredita que ele chegou a soltar uns predadores na praça pra acabar com elas? Pois é, que traz doença todo mundo sabe; mas aí ele não entrou em guerra só com os ambientalistas, mas com as criancinhas e, pior, com as ratas da igreja que alimentavam as pombas.

isso dava um belo conto erótico, hm? "o homem que queria matar todas as pombas da cidade"... rsrsrs

ó, na sexta te mando o filme, tá.
um beijo.

Ilaine disse...

Oi, Francisco!

Pombos e Pombos... Bela cronica.
Francisco, queria ainda lhe dizer acerca de seu comentário lá no Dilberto: Christoph Waltz é realmente um ótimo ator,concordo plenamente. Oscar merecido.
Beijo

( meu PC estragou, e aqui nao encontro alguns acentos... Perdoe!)

Beti Timm disse...

Querido Mestre Sobreira!

Eu havia decidido me dedicar mais a minha arte e deixar os blogs um pouco de lado, mas descobri que não vivo sem esse mundo encantador onde conheci tantas pessoas encantadoras como vc.

Incrível como os pombos são como cartões postais das cidades. Cada cidade tem o seu contingente dessas aves, mesmo polêmicos e as vezes contestados eles continuam sua trajetória!

beijinhos e saudades

Mariazita disse...

Querido Francisco
Achei este texto delicioso.
Talvez que quem leu fosse a criança que há dentro de mim (de todos nós...) e por isso gostei tanto...
Na verdade eu amo pássaros, dum modo geral, embora uns mais que outros.
De pombos gosto bastante; nas traseiras da minha casa há muitos, que alimento de vez em quando.

Beijinhos
Mariazita

Carla Marinho disse...

Oi Francisco, nao sei se vc lembra de mim do purviance. Seu site continua maravilhoso. Já estou acompanhando (sim, descobri há pouquissimo tempo o negocinho de seguir blogs. hahahahha)
beijos e aparece no purviance

Jota Effe Esse disse...

Bonita crônica, mas quanto aos pombos sou de opinião que cada cidade deveria criar um pombal fora do perímetro urbano (uma espécie de zoológico dos pombos)e alimentá-los naquele lugar, para que não transmitam doenças ao povo.

. fina flor . disse...

taí uma cena que adoraria ver: alguns políticos com os ternos sujos de titica de pombo, rs*

beijos, querido e bom fim de semana

MM.