terça-feira, junho 27, 2006

ALMAS PERVERSAS (Scarlett Street/1945)

Inspirado, o que muitas vezes não ocorre, o título em português desse filme de Fritz Lang ("M, o Vampiro de Dusseldorf") , agora lançado em DVD. A perversidade, a maldade, até mesmo a crueldade, estão entranhadas nos personagens, e não apenas nos principais. Se o casal Katherine "Kitty" March (Joan Bennett) e Johnny Prince (Dan Duryea) explora, como pode, Chris Cross (Edward G. Robinson), que, como iisso não bastasse, é casado com uma megera, que o humilha e hostiliza a toda hora, este também não é nenhum mártir. Chris esconde de Kitty a sua profissão (caixa de um estabelecimento comercial), se fazendo passar por pintor, quando, na verdade, só exercita a pintura como um lazer na folga dos domingos. E acaba sendo levado a assassinar Kitty, depois de ser cruelmente humilhado e insultado por ela, ao descobrir sua forte ligação com Johnny.

"Almas Perversas" é uma grata surpresa para quem não o conhece. Subestimado na época do lançamento, revela-se, hoje, como um dos grandes filmes de Lang da sua fase americana. É um filme noir, aderindo às principais características do gênero, entre as quais a presença da femme fatale, à qual Joan Bennett se entrega com uma força e uma determinação admiráveis. O seu momente mais marcante é quando ela tem Chris aos seus pés, curvado (denotando o amor, que atinge o servilismo, por aquela mulher) , pintando-lhe as unhas. A expressão do rosto é a própria imagem da vamp, coroada por uma frase ambígua que diz naquele momento: "Isso vai ser uma obra-prima". Ela pode tanto estar se referindo ao fato de ter as unhas pintadas por um artista, como ao golpe que aplicou, instigada pelo amante/gigolô, assinando os quadros de Chris e, com isso, ganhando dinheiro, além de obter o reconhecimento da crítica.

Mas se Lang se apossa, com o brilh9 quase sempre presente na sua obra, das diretrizes do gênero noir, não deixa de retornar às suas raízes expressionistas, contando, para isso, com a estimável colaboração da fotografia de Milton Krasner. Isso ocorre perto do final, quando Chris, no quarto de um hotel barato, começa a ter alucinações, "ouvindo" frases do casal que o explorara. Como observou A.C. Gomes de Matos, no livro "O Outro Lado da Noite - O Filme Noir" (Editora Rocco/2001) , aí "Lang usa a técnica expressionista com toda a força, para mostrar o delírio do protagonista, dando a idéia de como soube combinar a imagem e o som". É o grande diretor fazendo lembrar alguns momentos de "M", sua obra máxima.

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Aproveitando a oportunidade, convido os visitantes deste blogue, residentes em Natal, para o sarau sobre minha obra literária, a ser realiizado amanhã (dia 28), na livraria Siciliano, do Shopping Midway, a partir das 19 horas. Ficarei honrado com a presença dos que comparecerem.

Um comentário:

Anônimo disse...

Caro Francisco,
Vim visitar sua casota e deparo-me com este texto interessantíssimo sobre este filme que, sim surpreeende, embora não me apaixone o tema, e às vezes interrogo-me porque se farão filmes e tantos, onde a maldade a vários níveis e que veste peles tão diferentes impera, e não se fazem vestindo a bondade....enfim coisas que tenho a mania de pensar!
Como gostaria de estar aí amanhã no teu sarau...desejo as maiores felicidades e saiba que estarei presente em espírito.
Beijo afectuoso