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Foto : Google | | | | |
Sábado retrasado fui à festinha de aniversário dos dois anos de um neto. Gosto de ir a essas festinhas por causa das crianças, a visão delas brincando, gritando, se divertindo me traz de volta a infância. Faz-me bem observar aqueles meninos e meninas em sua inocência, inconscientes dos problemas, aborrecimentos e dificuldades que têm os seus pais (é verdade que que estes usufruem o lado bom que a vida oferece). Mas não há dúvida de que é a infância a melhor quadra da vida de uma pessoa e não é por outra razão que o adulto, principalmente o da minha idade, está sempre a relembrar os seus momentos de criança.
Essa última festinha teve a presença de um palhaço, o que deixou as crianças ainda mais animadas e fez este sócio do clube da terceira idade transformar-se, por alguns instantes, em uma delas, ao se lembrar da chegada anual de um circo mambembe à sua pequena cidade. O palhaço era a principal atração da meninada, Na verdade, eram dois ou três, que, com as suas brincadeiras, entre si, levavam-nos ao delírio. Claro que eles divertiam os adultos, soltando piadas, muitas vezes impróprias para a nossa idade, mas que não entendíamos e não maculavam a nossa inocência. Um palhaço (talvez o principal) criava um bordão, ou mais de um, que era repetido no dia a dia dos habitantes da cidade, até mesmo quando o circo ia embora.
Tenho uma lembrança recorrente de um dessas figuras que levam as pessoas ao riso franco e tão saudável, sobre as quais Fellini fez um filme. Era anão, de um moreno acentuado e gordo. Me recordo dele percorrendo as ruas na distribuição de folhetos para a apresentação do circo à noite. Os meninos à sua volta, os mais brincalhões mexendo com ele e a sua reação era fazer alguma graça que nos provocava gargalhadas.
Mas o palhaço, só o sabemos quando crescemos, é, em geral, um ser triste, quando não está no picadeiro ,fazendo as pessoas rirem., e têm que enfrentar a vida lá fora. Há um quadro impressionante do pintor francês Georges Rouault (1871-1958). que mostra três palhaços com uma expressão de tristeza de fazer dó. Já o escritor argentino Ernesto Sabato, no seu livro de memórias "Antes do Fim", narra um fato que presenciou, quando menino, e que lhe ficou gravado na memória: o suicídio do palhaço Scarpim y Bertoldito em plena apresentação da peça "Espectros" (segundo o escritor, ele gostava de interpretar personagens trágicos), ingerindo uma porção de um veneno, "enquanto o público aplaudia inocentemente".
Voltando à festinha de aniversário, em dado momento fui ao local onde o palhaço se apresentava. Havia uma "casinha" de madeira, com uma "janelinha", onde aparecia um boneco de engonço. Ao lado havia a coadjuvante do palhaço, bonitinha e muito jovem. Pela voz do palhaço, o boneco dialogava com a mocinha, cada um deles pedindo a manifestação quando um dizia algo do outro. Todas sentadinhas, as crianças interagiam com a dupla. Fiquei observando atentamente aquele espetáculo e, confesso, me emocionei. Me emocionei ao ver aqueles meninos e meninas que, por alguns momentos, tinham deixado de lado os video games e a televisão (e, alguns, talvez, até a Internet) para assistirem a algo novo para eles, um divertimento que extrai o seu encanto através da simplicidade, até mesmo, diria , de uma certa simploriedade, e com isso acontece a comunicação com a plateia. Eles que, ao contrário dos avôs, jamiais entraram num circo (jamais entrarão) e se depararam, entre outros atrativos, com a arte do palhaço.